quarta-feira, 29 de julho de 2009

Por trás da restrição aos fretados em SP

Desde segunda-feira (dia 27), os ônibus fretados estão impedidos de circular nas principais vias de São Paulo. Avenidas como a Paulista e Brigadeiro Faria Lima fazem parte da ZMRF (Zona Máxima de Restrição de Fretamento), área de 70 km² dentro do centro expandido. A polêmica medida, que visa desafogar o trânsito da cidade, esconde a real intenção da Prefeitura e do Governo de São Paulo.

Os fretados paravam em qualquer ponto da via, prejudicando a fluidez do trânsito. Com a restrição, o embarque e desembarque nos ônibus convencionais torna-se mais ágil nas pistas, antes "disputadas" entre os transportes público e particular.

Pontos de parada exclusivos foram criados próximo a estações da CPTM e do Metrô e o Expresso Tiradentes (antigo Fura-Fila), como alternativa aos usuários dos fretados para continuar o percurso rumo ao trabalho. Denota-se, na implantação desses bolsões, a esperteza da Prefeitura e do Governo de São Paulo de aumentar a arrecadação dos transportes públicos. Mais trabalhadores pagarão a tarifa de R$ 2,30 nos ônibus e R$ 2,55 nos trens.

O erro está na falta de planejamento: o "Expansão SP", grande trunfo midiático de José Serra, pré-candidato do PSDB à presidência da República em 2010, ainda está longe de ser concluído, o projeto de novas linhas continua no papel e só deve ser entregue na Copa do Mundo de 2014 de futebol. Apesar das novas estações, há sobrecarga de passageiros nas linhas existentes, principalmente quando estas se encontram, na Sé e no Paraíso. Com a restrição aos fretados, até estações novas, como a recém-inaugurada Santos-Imigrantes, tiveram sobrecarga de usuários.

Já a SPTrans, da Prefeitura, criou 11 linhas de ônibus especialmente para os passageiros dos fretados. Além de ocupar o espaço destes na via, os novos ônibus aumentam a arrecadação do sistema. Para ser "reeleito" em 2008, o prefeito Gilberto Kassab prometeu congelar a o preço da passagem em R$ 2,30 até 2009. A avaliação do transporte feita pelos usuários chegou ao valor mais baixo da década, 40%, segundo pesquisa da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos).

A reportagem de 29 de junho feita pelos jornais Folha de S.Paulo e Agora revela as consequências da manutenção da tarifa – sem aumento desde novembro de 2006. A cidade ganhou passageiros e perdeu veículos, e a chegada dos usuários dos fretados piora o conforto de quem usa os já lotados ônibus para ir ao trabalho.

A restrição aos fretados pode ser bem-vinda para auxiliar na fluidez do trânsito. No entanto, a Prefeitura e do Governo de São Paulo almejam maior arrecadação dos transportes, criando linhas especiais de ônibus e bolsões de parada próximos ao Metrô. O que "ajudaria" os usuários dos veículos contratados esconde a verdadeira intenção da administração pública.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

"Cyrano de Bergerac" para principiantes

Na última terça-feira (dia 21), o projeto "Toda Terça Tem Teatro", realizada em diversos CEUs (Centros Educacionais Unificados) e no CCJ Ruth Cardoso, exibiu a peça "Cyrano de Bergerac", escrita em 1897 por Edmond Rostand. O Grupo Saga, formado há 5 anos, adaptou o texto, condensando-o para a interpretação ter 80 minutos. A versão resumida evidenciou a essência da história e relevou seu lado cômico.

O elenco de nove personagens deu conta de explicar o drama de Cyrano, um exímio escritor apaixonado por sua prima, Roxane, mas impossibilitado de declarar seu amor, por ter um nariz avantajado. Além disso, Roxane gosta de outro homem, o belo conde Cristiano, mas terá que se casar com o duque de Guiche. Cristiano, sem veia literária, é ajudado por Cyrano para dizer versos bonitos a Roxane. Cyrano considera este um meio para se "declarar" à sua amada.

O humor característico da peça, salientando as dificuldades de Cyrano com seu grande nariz, foi quebrado no final, com a descoberta da verdade por Roxane e a perda de seus pretendentes. O final dramático – e impossível de ser alterado – não tirou a qualidade da apresentação, aplaudida de pé em seu término.

O Grupo Saga acertou ao inserir uma personagem, espécie de "apresentadora", que revelava as próximas cenas e interagia com o público, para este não se perder na história, extremamente concisa. O teor didático que a peça ganhou com a personagem agradou à plateia, formada, principalmente, por adolescentes da periferia da cidade, sem hábito de frequentar teatros, senão na própria escola.

A entrada dos pretendentes de Roxane, ao som de uma batida funk, fez muitos jovens saírem da cadeira e começarem a dançar. As três "assistentes" da moça, embora expusessem uniformemente seus desejos femininos, tinham personalidade própria: uma era mais controlada, outra estava "desnorteada" em cena. Peculiaridades que garantiram o riso do público.

"Cyrano de Bergerac" já recebeu adaptação cômica, desta vez para a TV (foto acima). No seriado "Chapolin", o herói ensinou um homem, que havia marcado um encontro sem ver a pessoa, a ignorar a beleza exterior, e o fez através da história de Cyrano. Roberto Gómez Bolaños também usou o texto de Edmond Rostand em um sketch do programa "Chespirito".

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Último dia do Anime Friends 2009 empolga fãs de tokusatsus

Otakus enfrentam fila de quase duas horas para assistir aos shows do evento

Fila, plaquinhas, fantasias. Ingredientes que sobraram na sétima edição do Anime Friends 2009, o maior evento de cultura pop japonesa da América Latina, realizado em dois finais de semana no Mart Center (zona norte de São Paulo) e encerrado no dia 19 de julho.

Os otakus – fãs de animes (desenhos animados) e mangás (histórias em quadrinhos) – tiveram de esperar cerca de duas horas para entrar. Nesse tempo, a criatividade aflorou nas já tradicionais plaquinhas, publicando de enquetes a comentários curiosos.

Criativas também foram as fantasias dos cosplayers: enquanto cinco rapazes se vestiram como os Cavaleiros do Zodíaco, outro grupo parodiou as guerreiras de Sailor Moon (foto). Até as Meninas Super Poderosas – em versão masculina – compareceram.

Embora algumas salas estivessem ausentes nesta edição, como a de Chaves e sobre Harry Potter, outras estrearam, como a do livro Crepúsculo. Também estiveram presentes a Editora Panini, com a versão manga da Turma da Mônica, e a PlayArte, com a promoção de DVDs de Os Cavaleiros do Zodíaco, Yuyu Hakusho, Naruto e outros animes de grande sucesso entre os otakus. A rede de cabeleireiros Soho transformou o visual do público por 1 kg de alimento não-perecível.

Vale destacar a apresentação da banda Wasabi, formada por brasileiros, às 16 horas. O set list empolgou a plateia. Músicas de animes como Naruto e Death Note dividiram o show com canções em português, marcantes na infância dos espectadores. As versões brasileiras de Pokémon, Shurato e Yuyu Hakusho deram tom nostálgico ao espetáculo.

O chamariz do último dia do Anime Friends é o Super Friends Spirits, show reunindo intérpretes japoneses de animesongs – as músicas que embalam os animes. Os protagonistas desta edição foram os cantores de tokusatsus – séries live-action japonesas – Yukio Yamagata, cantor da abertura de Gaoranger; Schnichi Ishihara (foto ao lado), intérprete da música de Gogo V; e Akira Kushida (foto acima) – cantor de Jiraiya, Jiban e Jaspion, séries exibidas pela extinta TV Manchete e aclamadas pelo público otaku. Antes, a Associação Pak Shao Lin realizaram uma apresentação de kung-fu, incomodando o público, apressado pelo show principal.

O Anime Friends 2009 terminou. Agora é esperar pela oitava edição, em 2010, e as mesmas peculiaridades do evento, como as filas quilométricas, atraso nos shows, gritaria dos fãs e muita história para contar no dia seguinte. Porque o Anime Friends é, sobretudo, uma confraternização entre fãs, vindos com caravanas do Brasil inteiro, ansiosos pelo acontecimento máximo.

Sérgio Dias conversa com fãs no CCJ Ruth Cardoso

"Mutante" esclarece por que não lançará o novo álbum da banda no Brasil

No mês do rock, o Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso (zona norte de São Paulo) recebeu, no último sábado (dia 18), o guitarrista dos Mutantes, Sérgio Dias. Por quase duas horas, ele falou sobre o passado e o presente do conjunto, além de classificar a divulgação na internet de material da banda sem autorização como "um tiro no pé".

Fãs de diversos lugares compunham a plateia. Desde o bairro da Pompeia (zona oeste de São Paulo), bairro natal de Sérgio Dias, até São José dos Campos (interior do estado), os admiradores dos Mutantes levaram discos de vinil para serem autografados pelo músico.

Dias relembrou a influência familiar no processo de composição do grupo. "Meu pai tinha uma livraria imensa. Quando fiz 13 anos, meu pai me deu Os Lusíadas. Eu li o negócio e não entendi merda nenhuma, mas alguma coisa entra. O lado cultural da gente era muito forte. A gente vivia no Teatro Municipal assistindo à minha mãe, às óperas. Minha casa sempre foi um centro de cultura."

Uma pessoa da plateia perguntou sobre o efeito das drogas na carreira do conjunto. O guitarrista declarou ter feito uso do ácido lisérgico (LSD) em apenas um álbum. "O único disco feito à base de drogas foi O A e o Z (gravado em 1973 e lançado em 1992). Todos os discos que são reverenciados e do qual eu acredito que sejam os mais criativos foram completamente caretas. Quando a gente tomou os ácidos, aconteceu uma coisa muito séria. Tem músicas do O A e o Z que foram compostas na hora, com três letras separadas ao mesmo tempo e cada um cantando a sua letra, o que para nós era 'mágico' ou 'impossível'."

Junto do baterista Dinho Leme, Sérgio Dias é o único remanescente da formação original do grupo, formado no final dos anos 60. Trinta e cinco anos depois de Tudo Foi Feito Pelo Sol (1974), o último álbum de inéditas, os Mutantes lançarão Haih no dia 8 de setembro, com novos integrantes. Dias comentou a semelhança do novo trabalho com o auge da carreira. "Uma coisa eu te garanto: é Mutantes. Agora, é Mutantes do século XXI. É Mutantes comigo com 58 anos de idade. É Mutantes com garotos de 22 anos tocando."

Um parceiro na nova fase dos Mutantes é Tom Zé, que já colaborou com o conjunto quarenta anos atrás. Sérgio Dias não esconde sua admiração pelo compositor. "Quando conheci o Tom Zé, eu tinha 16 anos. Não conseguia nem conversar com ele. O Tom Zé sempre foi um mestre, um gênio. Eu fui entender letras dele 20 anos depois. Quando a gente se encontrou no show [do aniversário da cidade de São Paulo, em 25 de janeiro de 2007] do [Museu do] Ipiranga, eu disse: 'Eu quero fazer música nova'. E ele disse: 'Vamos nessa!'."

Sérgio Dias elucidou os motivos pelos quais não assistiu ao documentário Loki – Arnaldo Baptista, sobre seu irmão e ex-parceiro dos Mutantes, ainda com as sequelas da queda do quarto andar de um hospital psiquiátrico, em 1982. "É muito dolorido para mim. Não aguento mais ver meu irmão se desenvolvendo ou coisa do gênero. Isso para mim beira o masoquismo. Prefiro guardar os momentos bons [com o Arnaldo] do que ficar vendo o depoimento da minha mãe, o meu depoimento. É chato."

O "mutante" criticou a atitude de muitos fãs que publicam conteúdo de artistas na internet sem autorização. "Imaginem uma banda nova que vocês admirem. Você diz: 'Puxa, essa banda é demais, é genial, vou colocar no YouTube, na internet.' Como é que o cara vai fazer o segundo disco? A ideia da 'democratização' da música é muito bonita, mas, ao mesmo tempo, é um tiro no pé, porque é o trabalho dele."

Para o guitarrista, grandes artistas saem do Brasil por conta da exposição indevida de seus trabalhos na rede. "Onde está todo o manancial da música brasileira, que está viva e desaparecida? Onde está Milton Nascimento, Edu Lobo, essas pessoas que são tão sérias e importantes? Cadê esses caras? Eles são a essência disso tudo. É uma pena ver esse tipo de talento ter que ir embora do Brasil, que, no fim das contas, é isso que acontece. Essa é a questão maior que vocês estão vivendo: se vocês querem ter a música popular brasileira aqui ou fora do país, o que é um negócio muito chato."

Haih será lançado mundialmente no dia 8 de setembro, exceto no Brasil. O "mutante" se justifica: "Quando fui falar com os diretores da Sony, os caras já não acreditaram. 'Bixo', eu conheço a indústria [fonográfica] brasileira. O negócio que não tem sucesso cai por terra. Imagina se ninguém pagasse ônibus, não teria ônibus. Estamos vivendo um momento extremamente sério. Como é que isso vai ser resolvido? Por que os Mutantes não estão lançando o disco no Brasil? É uma questão de debate para vocês".

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Loja das Casas Bahia permanece interditada

Segundo o setor de fiscalização da subprefeitura, o prédio não tinha licença para funcionar

No dia 27 de junho, o Letras Escapadas noticiou a interdição de uma loja das Casas Bahia na Vila Brasilândia (zona norte de São Paulo). Na ocasião, o encarregado pela rede, Ricardo Santos, informou que havia problemas quanto à documentação de funcionários e que a filial deveria reabrir na segunda (29) ou terça-feira (30 de junho), o que não aconteceu. A unidade, inaugurada em 2008, continua interditada pela subprefeitura de Freguesia/Brasilândia.

Após várias tentativas, finalmente a subprefeitura atendeu ao Letras Escapadas. O responsável pelo setor de fiscalização, Valdir Massashi Uchiyama, desmentiu as declarações de Ricardo Santos, afirmando que o local estava sem licença para funcionar.

De acordo com Uchiyama, a planta do prédio não tinha sido aprovada. Mesmo sem autorização, as Casas Bahia inauguraram a loja. Uchiyama ainda ressalta que a reabertura da filial da Vila Brasilândia depende da própria rede de varejo: "Eles vão ter que regularizar o prédio e pedir a licença para reabrir a loja". O responsável informou que as Casas Bahia já "entraram com uma planta", mas que falta ser aprovada pela subprefeitura.

Enquanto isso, os clientes têm a opção de se dirigir à unidade mais próxima, na Avenida Santa Marina, 2687, na Freguesia do Ó, ou esperar pela reabertura – ainda sem previsão – da unidade da Rua Parapuã, 1417.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Chapolin: a astúcia da América Latina

Por Luana Fagundes e Paulo Pacheco

Mais rápido que uma tartaruga, mais forte que um rato, mais inteligente que um asno”, Chapolin Colorado surgiu sob a concepção de satirizar os heróis norte-americanos com superpoderes e de fazer uma crítica social da América Latina, por ser um herói “sem dinheiro, sem recursos, sem inventos sensacionais, débil e tonto”, como diz seu criador, Roberto Gómez Bolaños. Apesar de medroso, Chapolin é valente por superar seu medo para ajudar a quem precisa.

A força bruta versus a inteligência

Chapolin surgiu em um momento de turbulência na América Latina. A estreia da série “El Chapulín Colorado”, em 1970, acontecia no contexto da Copa do Mundo de Futebol, realizada no mesmo ano no México, e da Olimpíada, sediada na capital em 1968, que trouxeram visibilidade ao país e à América Latina, palco de movimentos estudantis na década de 60. Reflexos da Guerra Fria (1947/8–1991), disputa ideológica, militar e espacial, envolvendo Estados Unidos (capitalista) e União Soviética (comunista).

O México, na época, era presidido pelo tio de Roberto Gómez Bolaños, Gustavo Díaz Ordaz Bolaños (1964-1970). Apesar de não ser ditatorial como o regime militar brasileiro (1964-1985), o governo não tolerava os protestos. Em setembro de 1968, o Exército ocupou a Universidade Autônoma do México (UNAM) a fim de acabar com as revoltas. No dia 2 de outubro, às vésperas da Olimpíada, 15 mil alunos protestaram nas ruas da Cidade do México contra a ocupação da UNAM. O Exército foi novamente chamado para acalmar a revolta e conter os manifestantes, duramente reprimidos, o que ficou conhecido como Massacre de Tlatelolco (foto). Até hoje, não se sabe o número certo de mortos.

Sigam os bons americanos!

A influência estrangeira nos países subdesenvolvidos foi tema de vários episódios de “El Chapulín Colorado”. A começar pelas citações irônicas de heróis norte-americanos. No episódio “La tribu perdida” (1973), uma personagem zomba do herói, declarando que seria melhor ter chamado o Batman no lugar dele. Chapolin respondeu à altura: “Em primeiro lugar, Batman não está porque está em lua-de-mel com Robin”. Em “No es lo mismo el pelotón de la frontera, que la pelotera del frontón” (1976), Chapolin, ao usar um cipó para se deslocar, comenta que ensinou o método “a um tal de Tarzan dos macacos, mas ele não aprendeu muito bem”.

Chapolin se enche de patriotismo ao declarar que seus defendidos não precisam de “heróis importados”. No episódio “Conferencia sobre un Chapulín” (1974), Bolaños, sob a pele de seu personagem Doutor Chapatin, explica que “tudo começou quando o povo da América Latina se deu conta que seria urgente que tivéssemos um herói local, um herói autóctone, um herói que falasse a nossa língua”.

O espírito nacionalista surgiu muito antes da chegada do herói. A sociedade mexicana estava dividida em 1900: enquanto a classe média – composta por cerca de um milhão de pessoas – desfrutava de certo conforto, trabalhando em escritórios e ouvindo músicas norte-americanas, uma nação camponesa – oito milhões de agricultores, a maioria de ascendência indígena – se encarregava da produção de grãos. Apesar de a economia ser eminentemente rural, a posse da terra era realidade para somente três por cento da população. Quem detinha o poder no campo e o controle da riqueza nacional era os latifundiários, realidade que se estendeu até a década de 30.

Nesta época, o modelo norte-americano de progresso começou a ser questionado. O cinema chegara à América Latina em 1890, associando o pensamento latino-americano à Europa e aos Estados Unidos. Hollywood definia o que o público esperava de uma produção cinematográfica: após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), 95 por cento de seus filmes eram assistidos pelos novos espectadores.

A visão norte-americana dessa época valia-se da raça e da cultura para interpretar os vários povos latino-americanos, tidos como culpados pela pobreza, pela instabilidade e pelas ditaduras. Faltava-lhes disciplina para formar sociedades estáveis e democráticas. A imagem que se criou era a de um mexicano preguiçoso e apático, muito embora a realidade dos lavradores e camponeses fosse outra.

Em 1929, os Estados Unidos dirigiram para a América Latina quarenta por cento de seus investimentos no exterior. Nessa época, movimentos nacionalistas transformaram a região, indo além da classe média urbana. O ressentimento tomou conta das críticas ao imperialismo norte-americano, em virtude da perda de metade do território e de resquícios de políticas implantadas sistematicamente, como a Doutrina Monroe (1823).

O sentimento nacionalista foi colaborado pela Revolução Mexicana, liderada por Emiliano Zapata e Pancho Villa, que, além de ter derrubado o regime do General Porfírio Diaz (1876-1911), instituiu a Constituição de 1917, concedendo, entre outros direitos, o de propriedade da terra. Uma vitória do campesinato.

Durante as décadas de 20 e 30, houve um incentivo da produção nacional no país: músicas e danças folclóricas, pratos tradicionais e artesanato. Filmes mexicanos, apresentando tipos másculos como Jorge Negrete, versão mexicana do caubói norte-americano, competiam agora com Hollywood. A produção cinematográfica das décadas de 40 e 50 também foi rica, graças a Fortino Mario Alfonso Moreno Reyes (1911-1993), eleito recentemente o melhor comediante do México, cujo personagem “Cantinflas” conquistou o público com seu jeito atrapalhado de falar. Durante a presidência de Lázaro Cárdenas (1934-1940), buscava-se idealizar um México melhor e mais justo. Sobre o imperialismo norte-americano, Cárdenas (foto) declarou a famosa frase: “Pobre México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”.

Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os nacionalistas enfrentaram desafios de ordem social, política e econômica, sofrendo, além de tudo, com a hostilidade dos Estados Unidos. Apaga-se, assim, a ideia do bom vizinho. Nos anos 40, o México dispunha de um sistema de partido único, o PRI (Partido Revolucionário Institucional), que caracterizava uma democracia aparente. Era um período de notável crescimento, em que a moeda mexicana mantinha-se firme. Os Estados Unidos exibiam prosperidade e “boa vida” através da mídia, com propagandas de carros e artigos domésticos. Entretanto, ofereciam pouca ajuda ao público mexicano, desejoso de alcançar tais bens.

Em “El Chapulín Colorado”, a hegemonia dos países industrializados no mundo subdesenvolvido é simbolizada por meio de Super Sam. O personagem é o paradigma do poderio norte-americano: uniforme semelhante ao do Superman – com direito ao famoso símbolo no peito do traje azul – e cartola com as cores da bandeira estadunidense. Como nunca fora chamado para ajudar alguém, suas aparições na série eram fruto da intromissão nas ações do Chapolin.

Enquanto Chapolin usava sua marreta biônica como arma, Super Sam tinha em mãos um saco de dinheiro, além do grito “Time is money!”. Saindo da ficção, em 1961, o então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy (foto), propôs a “Aliança para o progresso” durante a Conferência de Punta del Leste, no Uruguai. Na proposta, Kennedy forneceria 20 bilhões de dólares aos países latino-americanos por dez anos. A execução do programa ficou comprometida em virtude do assassinato de Kennedy, em 1963, mas denota-se o viés ideológico da ajuda financeira dos Estados Unidos, em plena Guerra Fria e apenas dois anos depois da Revolução Cubana.

A estreia de Super Sam na série merece uma atenção especial. Aconteceu em 1973, no episódio “De los metiches líbranos señor”. Nele, o bandido soviético Dimitri Panzov deseja se casar com uma camponesa já comprometida. Ao chamar pelo Chapolin, surge o herói errado, Super Sam. A camponesa insiste que quer ser ajudada pelo Chapolin, que aparece – tropeçando, como sempre.

No episódio, Chapolin e Super Sam duelam para decidir quem protegerá a pobre senhorita. Aproveitando-se da situação, Panzov rapta a moça e a prende dentro de casa com uma bomba. Chapolin corre do soviético, que, cansado, é levado a marretadas para dentro da casa da camponesa. Já Super Sam aproveitou-se da perseguição para entrar no local e desprendê-la, mas ela já havia se soltado e se encontrado com seu noivo.

A última cena do episódio é antológica. Com o soviético e o norte-americano dentro da casa, Chapolin, acidentalmente, senta no detonador da bomba, que explode. Do interior da casa, saem Dimitri Panzov e Super Sam, abatidos. O soviético saiu usando cartola; o estadunidense, o típico chapéu russo.

Já o episódio “Todos caben en un cuartito, sabiéndolos acomodar” (1977) é carregado de sutis representações da relação entre Estados Unidos e América Latina. Em um hotel com somente um quarto disponível, Chapolin e Super Sam são atendidos por duas pessoas diferentes, que mostram o mesmo quarto aos dois heróis. No entanto, eles não se veem em nenhum momento. Logo na chegada dos personagens à hospedaria, nota-se a discrição e humildade do mexicano – apenas com uma bagagem – e os excessos e o consumismo do norte-americano – trazendo cinco pesadas malas.

No mesmo quarto, América Latina e Estados Unidos se conflitam: enquanto Chapolin fecha a janela do quarto, Super Sam a prefere aberta. Super Sam prepara seu café-da-manhã sozinho (o individualismo presente nos super-heróis e na sociedade norte-americanos) e Chapolin o devora. A hora de dormir ilustra a frase do presidente Cárdenas. Os dois heróis, sem preceber, passaram a noite na mesma cama.

As referências históricas nos episódios de “El Chapulín Colorado”, como a alusão à Guerra Fria (“De los metiches líbranos señor”) e à relação entre estadunidenses e latino-americanos (“Todos caben en un cuartito, sabiéndolos acomodar”), permeiam o trabalho de Roberto Gómez Bolaños em “El Chapulín Colorado”, buscando satirizar uma época conturbada no mundo dos anos 60 e 70. A fraqueza latino-americana, em contraposição ao individualismo estadunidense, não é empecilho para conseguir a vitória, pois o herói, embora não seja forte, é astuto, como diz o famoso grito de Chapolin Colorado: “Não contavam com minha astúcia!”

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Mário Lúcio de Freitas para todos os gostos

Jovem Guarda, novelas e desenhos animados compõem carreira versátil do artista

Mário Lúcio de Freitas é um nome pouco conhecido por grande parte do público. No entanto, basta citar alguns de seus trabalhos que a maioria o reconhecerá: Mário fez composições e arranjos para comerciais, novelas da Rede Globo e, principalmente, para aberturas de programas do SBT. Entre tantas músicas, uma é especial, exibida até hoje: a abertura da série Chaves.

Aos 60 anos, Mário possui uma longa carreira: aos quatro anos já era artista, trabalhando com a família como palhaço em diversos circos. Na "Caravana do Peru", conheceu Silvio Santos, o futuro dono da emissora para a qual o então palhaço comporia diversas músicas.

Não demorou muito para o pequeno Mário Lúcio atuar em programas de televisão, como Praça da Alegria, na TV Paulista (atual Rede Globo), e na famosa série Vigilante Rodoviário.

Simultaneamente, a carreira musical de Mário aflorava. Apesar de já ter cantado no circo, apenas na década de 1960 começou a tocar guitarra, com uma professora especial, a namorada de um grande amigo que, mais tarde, o destino os cruzaria de novo: Marcelo Gastaldi, o dublador do Chaves, também conhecido como “Maga”.

Embora tenha aprendido a tocar guitarra, Mário precisou ser contrabaixista do conjunto The Giannini's, que havia sido contratado pela Rede Record para aquecer a fila enquanto as portas do teatro não abriam para mais uma edição do programa Jovem Guarda. O acaso pregou mais uma peça: um contrabaixista da banda The Beatniks saíra do grupo, sendo substituído por aquele que estava tocando na rua, Mário Lúcio.

Na época, um relacionamento o fez amadurecer antes do tempo: tornou-se, aos 17 anos, pai de Júlio César, hoje com 42 anos.

Sua aptidão para a música o levou novamente para a TV, desta vez como apresentador e produtor musical. Na Cultura, ensinava a tocar violão no programa Violão pela TV. O destino o levou novamente para a Globo, produziu músicas para novelas como Vamp, Barriga de Aluguel, Rainha da Sucata e Meu Bem Meu Mal.

Em 1981, voltou trabalhar com Silvio Santos, desta vez pela TVS (atual SBT). Ali, reencontrou “Maga” e, juntos, contribuíram para o sucesso de uma série preterida pelos executivos da emissora, até pelo próprio Silvio: Chaves. Gastaldi emprestou sua voz ao protagonista, enquanto Freitas cuidou da parte musical. É dele a música de abertura do programa, em exibição desde 1993.

Os jovens conhecem Mário Lúcio pelo seu trabalho em dublagem. Após o fechamento de um estúdio em sociedade, Mário fundou sua própria dubladora. A Gota Mágica recebeu os desenhos animados mais venerados pelos jovens de hoje (crianças nos anos 1990): Os Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball, Bananas de Pijamas e Ursinhos Carinhosos, entre outros títulos.

Nesses trabalhos, nota-se a participação da família de Mário Lúcio: a cantora Sarah Regina, de quem foi marido por 15 anos, cantou em diversas aberturas de desenhos e no CD de Os Cavaleiros do Zodíaco, lançado em 1995. Este disco também contou com a participação de Karina, Rodrigo e Felipe, filhos de Freitas.

No fim dos anos 1990, Freitas viveu seu “inferno astral” (fazendo um trocadilho com uma de suas composições para o álbum do desenho Os Cavaleiros do Zodíaco): seu casamento com Sarah Regina terminara e a Gota Mágica teve de ser fechada por motivos financeiros, embora tenha funcionado sem estúdio próprio até o começo da década seguinte. Mário encerrou as atividades de seu estúdio com a série de cujas músicas estão na boca do público. O SBT recebera novos episódios de Chaves, exibidos no programa Clube do Chaves. A Gota Mágica foi responsável pela versão brasileira.

Mário Lúcio, agora como diretor de dublagem, não pôde contar com seu fiel companheiro – Marcelo Gastaldi havia falecido em 1995. Para substituí-lo, chamou o ator Cassiano Ricardo, que recebeu duras críticas por tentar se passar pelo antigo dublador, venerado até hoje pelos fãs. Entretanto, segundo Freitas, qualquer voz seria vetada, já que a dublagem de “Maga” foi marcante.

Pai de cinco filhos e avô de quatro netos, Mário Lúcio de Freitas, hoje casado com a produtora Mary Hellen, participou da vida de gerações de crianças com suas músicas e dublagens de desenhos, e recebe o apoio da família: “Todos gostam muito do trabalho. Alguns ainda assistem, já viram muitas vezes”, declara.

Atualmente, Freitas colhe os louros de seu trabalho musical. É presença garantida em eventos sobre o seriado Chaves. Breve, pretende reunir sua trajetória em um livro, ainda sem previsão de lançamento. Mas será que seus quase 60 anos de carreira caberão em uma publicação?

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Protesto "#forasarney" fracassa em SP

O protesto a favor da renúncia de José Sarney (PMDB-AP) da Presidência do Senado fracassou. Em São Paulo, entre 50 e 70 manifestantes, segundo a PM, se concentraram no vão livre do MASP, na Avenida Paulista.

O movimento começou por volta das 19 horas e foi acompanhado pela imprensa. Fotógrafos da Folha de S.Paulo, repórteres da Folha Online e a MTV cobriram a passeata, liderada pelo VJ Felipe Solari. Os veículos não mediram esforços para captar as melhores imagens de cartazes e os melhores ângulos do protesto.

Tentando se redimir do fracasso do movimento, Solari argumentou que iria encerrá-lo para poder assistir ao jogo do Corinthians. A passeata foi vergonhosa: o grupo atravessou a Avenida Paulista, aos gritos de "Fora, Sarney!" e se concentrou em frente ao Parque Trianon.

A manifestação não fracassou apenas em São Paulo. Segundo relatos via Twitter, em Brasília compareceram 50 pessoas. Em Porto Alegre, apenas duas. No Recife, uma. Segundo postagens de manifestantes no Twitter, o humorista e apresentador do CQC, Rafinha Bastos, compareceu nos instantes finais do ato público, que durou pouco mais de uma hora.

Jornais de bairro: a representação da comunidade

Periódicos locais se consolidam como prestadores de serviço para seus leitores

Já dizia o editor do Rocky Mountain News, jornal publicado em Denver (EUA), de abril de 1859 a fevereiro de 2009: "Uma briga de cães nas ruas de Denver merece mais espaço do que uma guerra na Europa". O jornalismo local se firma como um importante veículo para a comunidade se expressar e reclamar sobre problemas relacionados ao bairro onde mora.

O jornal é um exemplo. Desde a circulação de O Braz, o primeiro periódico voltado para uma região específica de São Paulo, em 1º de setembro de 1895, as publicações – geralmente em formato pequeno, no estilo tabloide – apostam na prestação de serviço como enfoque principal.

No Impacto News não é diferente. Em circulação desde 1999, o periódico noticia, sobretudo, buracos em vias públicas e esgotos a céu aberto. As reclamações se enquadram à região por onde o jornal circula gratuitamente a cada quinze dias: os bairros próximos à Parada de Taipas, zona noroeste de São Paulo, que não se desenvolveram como outras regiões da cidade.

O editor César Borges esclarece como é feito o contato do leitor com o jornal: "Os leitores nos contatam por telefone, fax ou e-mail; em seguida saímos para a apuração". Após isso, o jornal comunica à instituição reclamada sobre o problema, geral-mente por e-mail. "As reivindicações que envolvem fornecimento de água e saneamento básico são enviadas à Sabesp. As que envolvem luz e energia elétrica, à Eletropaulo. Reclamos sobre buracos na rua são levados à subprefeitura", afirma.

Na coluna "De olho na região", o jornal informa aos moradores sobre futuras ações da Prefeitura e de outros órgãos prestadores de serviço no bairro, desde a limpeza de bueiros até a passagem de uma biblioteca móvel pelas ruas da região.

O editorial é o espaço destinado à opinião do jornal. O mais recente aborda como o álcool atua no organismo, alertando os que ainda permanecem com o costume de beber antes de dirigir. "Em alguns editoriais, além da opinião do jornal, existem informações de utilidade pública", explica.

A coluna "Antes e depois" mostra o problema assinalado pela comunidade e sua resolução. Em sua edição mais recente, o periódico noticiou que vereadores registraram nos Anais da Câmara Municipal o requerimento RDS 031/09, que contém voto de júbilo e congratulações ao jornal pelo serviço que presta à população da zona noroeste de São Paulo, especialmente através dessa coluna.


Segundo César, a única fonte de renda do jornal é o amplo espaço dado a lojas dos bairros por onde circula: "Não nos vinculamos a nenhuma associação, pois teríamos de repassar uma porcentagem da venda dos anúncios para ela". Os anúncios são cobrados de acordo com o tamanho e a localização na página.

Outro jornal atuante na região noroeste de São Paulo é o Freguesia News. Segundo o editor Célio Pires, "o jornal enfatiza a informação do leitor; no entanto, também aproveita material informativo oficial."

O periódico é distribuído gratuitamente em bancas e enfoca todos os acontecimentos relacionados à região por onde circula semanalmente: a Freguesia do Ó e seus bairros vizinhos.

Célio afirma que a dependência da venda de anúncios é "evidente, já que o jornal é gratuito" e ressalta: "O mesmo fato também ocorre na grande imprensa, que esconde essa relação". O editor declara haver preconceito de algumas empresas contra a publicação: "Há preconceito sim, principalmente das agências de publicidade e de grandes supermercados, pois não há quem fiscalize o jornal de bairro como tem o IVC (Instituto Verificador de Circulação) na grande imprensa, e também há muito jornal de bairro picareta".


Brás foi o precursor dos jornais de bairro

O livro Os jornais de bairro na cidade de São Paulo aponta que os primeiros jornais de bairro surgiram no Brás, zona central de São Paulo. Após o lançamento de O Braz – que teve somente três números publicados -, surgiram a Tribuna do Braz (1897), a Gazeta do Braz e a Folha do Braz (1898). De acordo com a publicação, todos eles tiveram a defesa dos interesses do bairro como intenção.

O primeiro jornal de bairro fora do Brás apareceu em 1900, com a publicação de O Bandeirante, no bairro da Penha (zona leste). Depois, outros bairros receberam suas publicações: o Belenzinho, zona leste, e O Marco (1907); a Luz, centro, e O Vagalume (1908); a Lapa, zona oeste, e a Tribuna da Lapa (1910); Santo Amaro, zona sul, e o Sol Levante (1910); Santa Cecília, centro, e O Ceciliano (1911).

Atualmente, estima-se que cerca de 200 jornais de bairro circulam na cidade.